terça-feira, 15 de janeiro de 2013
Capítulo 20 (Sorte ou Azar)
Capítulo 20
Mas no minuto que eu me sentei, ela tinha ido embora. A sorridente garota
de cabelos vermelhos no longo vestido branco tinha desaparecido. Se é que ela
estivera ali. Porque certamente ela fora apenas um sonho. Em um estado entre
acordada e adormecida, eu tinha pensado que tinha visto minha ancestral do lado
da minha cama, dizendo o meu nome. Tinha que ser isso. Porque eu não acreditava
em fantasmas, não mais do que eu acreditava em magia. Pelo menos, não a partir
dessa noite, de qualquer jeito. Foi enquanto eu estava dizendo isso a mim mesma
que eu senti alguma coisa em volta do meu pescoço. Alguma coisa que não estava
lá quando eu fui dormir. Alcançando-o, eu percebi que era o colar de pentagrama
que Lisa havia me dado. Aquele que eu lembrava nitidamente de ter tirado do meu
pulso e jogado do outro lado do cômodo mais cedo, nem mesmo olhando para ver
aonde ele caira. E mesmo assim ele estava agora em volta do meu pescoço. Um
sentimento de - o quê? Não medo. Porque eu não estava amedrontada. E nem apreensiva.
Meu estômago não doia nem um pouco. Mas alguma coisa,
qualquer coisa, chamava a minha atenção. Eu ainda sentia a estranha calma
que eu havia experimentado ao acordar, mas agora ela estava unida
com...felicidade. Eu estava feliz. O que estava acontecendo? Por que eu não
estava com medo? Colares não se amarram sozinhos. Alguém tinha achado o colar e
o colocado de volta no meu pescoço. Mas quem? Quem poderia ter entrado no meu
quarto e feito algo assim, tão calmo e gentilmente que eu não tinha acordado?
Petra? Ou o fantasma da minha ta-ta-ta-ta-ra avó cuidando de mim quando eu mais
precisava dela? Me mostrando que - justamente como eu sempre suspeitei - eu
realmente era a filha que ela mencionara - a que estava destinada à grandeza
como uma bruxa. Não Tory. Somente eu. Tinha sempre sido eu. Eu só precisava
acreditar. Nela. Em mim mesma.
De repente, eu sabia que o sono tinha ido embora. Minha pele estava
formigando como se tivesse sido eletrificada. Eu pulei da cama e fui para a
janela. Uma turva luz azul estava entrando pelas linhas transparentes da
persiana - eu tinha esquecido de puxa-la. Eu presumi que a luz fosse do
apartamento vizinho atrás da casa da Tory. Mas quando eu empurrei a persiana
para o lado, eu vi que a luz vinha de uma lua cheia, pesada e branca, suspensa
no céu da noite, tão brilhante que até tinha um pequeno arco-íris ao seu redor.
Lua minguante, eu sabia de ter lido no livro de bruxas que eu comprara, era a
época para fazer feitiços de banimento. Lua cheia era quando, tradicionalmente,
as bruxas faziam feitiços de prosperidade e crescimento. Mas na noite de lua
cheia...bom, basicamente tudo vale. Qualquer coisa é possível debaixo de uma
lua cheia. É por isso que tantas pessoas acabam na sala de emergência nas
noites em que a lua é cheia. Pelo menos, é o que eles dizem em ER. Que estranho
que essa noite, dentre todas as noites, tenha lua cheia. Ou era por isso que
Branwen tinha finalmente conseguido aparecer para mim? Por causa da lua...e da
minha necessidade? Então eu escutei algo vindo do jardim. Parecia, na verdade,
com Mouche. Mas o que Mouche estaria fazendo fora a essa hora da noite? Alice
sempre se lembrava de chamá-la e de trazê-la para dentro depois de escuro. A
gata dormia com ela toda noite. Quem poderia ter deixado Mouche sair? Então eu
notei algo estranho. Tinha uma luz ligada no gazebo. Não. Certamente não. Eu
tinha que estar imaginando coisas...do jeito que eu tinha imaginado ver
Branwen. Se eu tivesse imaginado ter visto Branwen. Mas não. Lá estava de novo.
Não só uma luz, mas várias, quase como se... ...como se alguém estivesse
acendendo velas ali embaixo. Alguém que se parecia muito com a minha prima
Tory.
Sem ligar a luz - eu não queria que Tory visse, soubesse que eu estava
acordada, e tivesse um aviso avançado que eu estava indo ver ela - eu deslizei
do meu pijama e coloquei uma calça jeans e um suéter. Eu carreguei um par de
mocassins na minha mão enquanto eu saia do meu quarto e descia as escadas, para
que os meus passos não acordassem ninguém. Quando eu cheguei à porta que levava
ao jardim, eu coloquei meus sapatos e desci as escadas para o jardim. Tinha
bastante luz - azulada, mas ainda assim bastante - para poder enxergar. Mas eu
não precisava da luz da lua para ver o brilho amarelo que vinha de trás do
vidro fosco do gazebo. Ou as três magras sombras produzidas por ele. Era Tory.
Tory e seu clã. E de repente eu lembrei dos cogumelos. Os cogumelos que Tory
tinha pedido a Chanelle para ajudá-la a raspar de uma lápide na luz da lua
cheia. A lua estava completamente cheia agora. Ela começaria a minguar amanhã.
Para o que for que ela estivesse planejando usá-los, isso tinha que acontecer
hoje a noite. E para o que for que ela estivesse planejando usá-los, tinha que
ser algo ruim, se eu conhecia a Tory. Não podia ser nada que tivesse a ver
comigo. Ela tinha me dizimado no baile. Ela tinha que saber disso. Não, pra
quem quer que esse feitiço estivesse destinado - Petra, Zach, quem sabia? -
essa pessoa não era eu. Tory sabia que ela estava bem livre de mim. Pela
primeira vez desde que eu tinha acordado naquela noite, eu senti outra coisa
além de uma estranha calma. Raiva. Eu senti raiva. Não pelo que Tory tinha
feito comigo - eu mereci aquilo, pelo que eu fiz com Dylan. Não, eu estava com
raiva porque, tendo testemunhado hoje a noite os resultados diretos da minha
própria tentativa de manipular a vontade dos outros, Tory ainda não conseguia
ver que fazê-lo era errado. Bom, isso era o bastante. Estava tudo acabado. Ela
tinha que ser impedida. Eu iria impedi-la. Que foi quando eu abri com um
empurrão a porta de vidro do gazebo para dizer a ela...
...até que o que eu vi lá dentro fez com que a minha voz secasse na
garganta. Ali estavam elas, todas as três, Tory ainda em seu virginal vestido
branco do baile. Gretchen e Lindsey, por outro lado, estavam totalmente
enfeitadas com o usual delineador pesado e estavam usando preto. Elas estavam
sentadas em volta de algo que parecia um pequeno altar na mesa de topo de vidro
no meio do gazebo, completo com doze velas acesas (pretas, é claro) e algo
parecido com um cálice vazio no meio da mesa/altar. E elas não pareciam nem um
pouco surpresas de me ver. Bom, Tory não parecia, de qualquer jeito.
"Pronto," ela disse, com uma certa quantidade de satisfação em sua
voz. "Eu
disse que ela viria, damas. Não falei?" A única resposta de Lindsey -
não surpreedentemente - foi rir. Mas Gretchen, me lançando um olhar desdenhoso,
disse, "Eu não entendi, Tory. Como você sabia?" "Porque ela é
fraca," Tory disse. Foi quando eu vi o que ela estava segurando em suas
mãos, debaixo da mesa de tampo de vidro. Era Mouche, lutando para se soltar e
fazendo bastante tumulto para isso. O mesmo tumulto que eu tinha escutado do
meu quarto. Que foi porque Tory abruptamente deixou o gato ir embora. Porque
Mouche havia feito o que Tory precisava que ela fizesse. Ela me atraiu para o
gazebo. Exatamente aonde Tory me queria. "Se ela é fraca," Gretchen
disse ameaçadoramente, "então para que nós queremos ela?" "Eu te
disse. Não é ela que nós queremos," Tory disse. "É o sangue dela."
Que foi quando eu finalmente percebi o que estava acontecendo - porque elas
estavam sentadas ao redor do cálice vazio. E pra que eu estava lá. Como o
sangue do meu rosto, eu senti toda a determinação inserida vagarosamente por
Branwen escoar. Eu me girei para ir embora - mas eu não fui rápida o bastante.
Eu abri a porta - o bastante para Mouche correr - mas Gretchen, que se revelou
tão forte quanto era alta, me agarrou à força e me puxou de volta, me
empurrando rudemente para a cadeira de ferro forjado do lado oposto da mesa de
Tory.
"Amarre as mãos dela," Tory ordenou. E Lindsey e Gretchen
obedientemente criaram uma corda de cetim preto - provavelmente o cinto do
roupão do pai de uma delas - e começaram a enrolar-la - não muito solta, não me
importo de dizer - em volta do meu pulso. De fato, elas me amarraram com
bastante força. "Meninas," eu disse. Eu disse a mim mesma para não
entrar em pânico. Era provavelmente só algum tipo de ritual de trote estúpido.
Provavelmente, elas iriam me fazer se juntar ao clã idiota delas e fazer um
juramento estúpido. Só um pouco de sangria, para nos tornarmos "irmãs de
alma", ou qualquer coisa. Ainda assim. "Eu acho que vocês cortaram a
circulação dos meus dedos." "Cala a boca," Tory disse.
"Está bem," eu disse. "Mas se os meu dedos ficarem pretos e
começaram a cair-" "Eu disse, CALA A BOCA." Foi quando Tory se
levantou de sua cadeira e me acertou com um golpe. Forte. Palma aberta, de lado
a lado do rosto. Eu acho que poderíamos dizer que foi mais um tapa do que um
golpe. Ainda assim, doeu. Por um minuto, eu vi estrelas. Foi quando eu percebi
que isso provavelmente não era um trote afinal. "Está tudo pronto?"
Tory perguntou para suas duas cúmplices, que concordaram. Gretchen parecia
entusiasmada. Somente Lindsey parecia um
pouco surpresa pelo tapa. Pelo menos, pelo que eu pude observar, por olhos
que tinham se enchido automaticamente com lágrimas pelo golpe. Tory era muito
mais forte, fisicamente, do que eu achava que ela era. Aquela tapa tinha DOÍDO.
"Tudo bem," Tory disse. Ela retornou ao seu assento. "Hoje a
noite, debaixo dessa luz nova, um tempo de novos começos, eu vou corrigir um
erro," ela começou. "Há cento e cinquenta anos, uma das mais
poderosas bruxas de todos os tempos, Branwen, que havia nascido com o dom da
magia, previu que uma descendente sua iria herdar seus notáveis poderes. Por
toda lei que é natural e certa, essa descendente deveria ter sido eu. Mas por
alguma razão completamente idiota, parece que é a minha prima Jinx."
"Não sou," eu disse. Porque, apesar de eu ter visto Branwen no
meu próprio quarto essa noite, eu desconfiava que, baseada em suas próprias
experiências, ela provavelmente concordaria que negar possuir qualquer
habilidade de bruxa era o caminho a seguir. "Não sou eu." Tory olhou para
mim. "Não," ela disse, "interrompa a cerimônia." "Mas
não sou eu, Tory," eu disse, desesperada. "Vamos lá, isso é estúpido.
Como eu poderia ter poderes mágicos? Você sabe que eu sou a pessoa mais azarada
na face do planeta-" "Como você explica Dylan, então, e a devoção
dele por você?" Tory repreendeu. "Foi só um feliz acaso."
"Shawn?" "Isso foi você," eu disse. "Você fez ele ser
expulso." "Claro," Tory disse. "Mas todo mundo culpa você.
E quanto ao Zach?" Eu pestanejei para ela. "Bem, Jinx? E. Quanto. Ao.
Zach?" E, exatamente assim, estava de volta. A raiva que eu tinha sentido
mais cedo. A raiva que Lisa tinha que eu precisaria quando o tempo chegasse.
"Eu te disse um milhão de vezes," eu disse. "Zach não gosta de
mim desse jeito. Nós somos só amigos...e provavelmente não somos mais nem isso,
graças a VOCÊ e aquela SUA boneca estúpida, então-" Tory se levantou, uma
mão erguida como se fosse me bater de novo. Eu olhei para ela, desafiando-a -
só desafiando-a - a tentar de novo. Se ela chegasse um passo mais perto, eu
iria chutá-la na cara. Mas Lindsey, dentre todas as pessoas, parou-a com seu
choramingo. "Podemos acabar com isso de uma vez? Estou morrendo de fome. E
você sabe o que acontece quando o açúcar no meu sangue fica baixo."
"Está bem," ela disse. Foi quando Tory pegou a faca. Uma faca enorme
- decorativa, do tipo que você compra nessas lojas que vendem facas
ornamentais, como essas usadas nos filmes do Senhor dos Anéis.
Uma olhada para a faca, e eu estava acabada. Era isso. Eu levantei-me da
cadeira - só para Gretchen me empurrar de volta e me segurar com as duas mãos
pressionadas, fortemente, nos meus ombros, enquanto eu me contorcia. Vendo que
eu não iria escapar desse jeito, eu abri a boca para gritar- Mas Tory,
antecipando a manobra, empurrou suas duas longas luvas de seda na minha boca,
me amordaçando efetivamente. "Pare de lutar, Jinx," Tory estava
dizendo, no que era uma voz bem tranquilizadora, para ela. "Isso é o que
você quer, se lembra? Você sempre quis só ser normal, certo? Bom, assim que nós
pegarmos sangue suficiente seu para eu beber, eu vou assumir os seus poderes, e
você não vai mais ter que se preocupar. Eu fiz uma poção exterminadora com
alguns cogumelos muito raros. Você pode bebe-la, e não vai mais precisar se
preocupar com azar. Todos os poderes que você herdou de Branwen vão sumir. Em
vez disso, eu vou ter eles." Tudo bem. Isso era ruim. Isso era muito ruim.
Eu tive um pouco de azar antes disso, era verdade...mas isso definitivamente
era pior. Eu tinha que sair disso. Mas como? Eu estava completamente impotente.
Gretchen era forte. Essa corda estava amarrada tão apertada. Eu não podia
gritar. O que eu podia fazer? O que qualquer um faz quando toda a esperança se
foi, e todo o resto falha? O que era que Lisa da Encantamentos havia dito? Tory
não pode me machucar se eu...se eu...se eu o quê? Por que eu não conseguia
lembrar? Abraçar a magia. Mas como eu poderia? Como eu podia abraçar algo que
havia me causado nada além de sofrimento por tanto tempo? Quer dizer, olhe o
que aconteceu com Dylan. Olhe o que aconteceu com as pessoas no hospital na
noite que eu nasci. Olhe o que havia acontecido essa noite no baile. Eu não
podia abraçar algo que tinha bagunçado com tantas vidas, algo que eu tinha
presumido que era mau.
"Espera um minuto," Lindsey disse. "Você vai beber o sangue
dela?" "O que você esperava?" Tory exigiu. "É um ritual de
sangue. Dã." "Eu sei," Lindsey disse, ficando, se uma coisa
dessas era possível, mais pálida ainda. "Mas eu não sabia que você iria
beber ele. Eu também tenho?" "Você quer que eu seja uma bruxa de
verdade," Tory rugiu, "ou não?" "Bom," Lindsey disse.
"Sim. Eu acho. Eu não sei. Mas você vai mesmo fazê-la beber aquele negócio
com os cogumelos dentro? E se ela ficar doente? Eles podem ser venenosos, pelo
que você sabe." "Não vai importar," Tory disse. "Ninguém
vai acreditar nela. Eles vão achar que ela se envenenou, por conta do que
aconteceu no baile. E até lá eu terei os poderes dela - que ela nunca apreciou,
muito menos aprendeu como usá-los corretamente. E mamãe e papai vão ficar nas
minhas mãos." Para mim, Tory disse, em uma voz que era novamente
tranqüilizadora, "E Zach vai me amar, não a ela. Espere e verá."
Mas eu mal ouvi ela. Porque eu estava pensando, E se o que Lisa tinha dito
era verdade, e todas as coisas ruins que tinham acontecido comigo não tinham
sido causadas por azar, mas por medo...medo interno? Medo do que eu realmente
era? Medo que QUEM eu realmente era. A magia vai me salvar. Branwen vai me
salvar...se eu abraçar aquilo que eu temo. E de repente, minha mente ficou
vazia. Ao contrário, eu pensei na magia e como ela podia me salvar. Eu pensei
na lua, tão brilhante e alta, com aquele arco-íris em volta dela. Eu pensei nas
rosas florescendo pelo jardim todo. Eu pensei em Branwen, e como ela tinha
devolvido o meu colar, e na calma que eu senti após ve-la, sorrindo, do lado da
minha cama. E eu pensei em Zach, na casa ao lado. Tudo que ele tinha que fazer
era olhar pela janela. Então ele veria o gazebo...ele me veria. "Eu não
sei mais por quanto tempo eu posso segura-la," a voz de Gretchen soava
tremida com o medo. Eu não tinha percebido aquilo antes. Mas agora, era como se
os meu sentidos tivessem sido aguçados. Eu estava ciente do perfume das rosas
no ar, tão doce.
Acorda, Zach. Olha pra lua, Zach. Eu estou aqui, Zach. Eu estou aqui
embaixo. "Está bem," Tory parecia furiosa. "Então cala a boca e
assista enquanto eu faço isso." Tory então começou a "fazer
isso" segurando a faca para que a lâmina cintilasse no luar que entrava
pelo teto de vidro do gazebo. Então Tory enfatizou, "Em nome de Hecate, e
Branwen, e...e de todas as bruxas do mundo, eu tiro dessa mulher o que por
direito pertence a mim." Ela sinalizou para que Lindsey se abaixasse e
agarrasse os meus dois pulsos - o que ela fez, apesar de eu ter lutado para
afastá-los dela, ao mesmo tempo que lutava para me libertar do forte agarro de
Gretchen - e os segurasse acima do cálice. E, sem o menor sinal de hesitação,
Tory começou a descer a lâmina brilhante que ela segurava. Que foi quando três
coisas aconteceram simultaneamente. Lindsey soltou as minhas mãos e gritou,
"Ah meu Deus, Tory! Você não pode realmente-" E eu ergui o meu joelho
contra a parte de baixo da mesa o mais forte que eu pude, inclinando o pesado
vidro - e o cálice, as velas, e a poção de cogumelos em cima dele - na direção
da Tory. E eu escutei a porta do gazebo abrir drasticamente, e uma familiar voz
masculina disse, "Que diabos está acontecendo aqui?"
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário